sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Mergulho













Era dessas noites claras.
Círculos de espumas boiavam
nas águas de brancas nebulosas.

No alto da palmeira
o menino de corpo moreno
tecia uma tanga de ramos
apoiado no entrelaçado
das folhagens.

Observava o redemoinho de
faces, cabelos e lábios.
E as espumas - estrelas
brancas, pálidas, flutuantes,
algumas pontas submersas
nas ondas, cobriam o mar.

Observava a dança silenciosa
dos fantasmas sobre as águas.
Homens de barbas longas,
uniformes envelhecidos,
e mulheres de saias esvoaçantes,
em rodopios orgíacos.
Vinham à tona festejar a lua
e mais uma vez reclamar
os corpos consumidos.

De um lado, tremulando na brisa
o mastro, as velas, a bandeira.
Galeão espanhol
em ruínas.

O menino deixou cair
a tanga em movimentos espirais.
Saltou do alto dos ramos, em voo.
Mergulhou no oceano branco,
bebeu a enxurrada de rostos,
pressionou a guelra dos pulmões,
atravessou as tábuas soltas,
os peixes, as ossadas,
a grande flecha de lodo,
apanhou no fundo das águas
a ostra de pedrinhas coloridas
e voltou para a superfície
com os cabelos envoltos em algas.
Trazia no rosto
imagens aprisionadas
em mil semblantes do tempo,
dos destroços de uma
Civilização desconhecida.

(em Imagens, 1990, Editora Nova Safra, Belo Horizonte)

Um comentário:

Anônimo disse...

Nossa! que belo mergulho! lindo, como sempre.
Muita luz
Ana Coeli