"Nenhum
homem é uma ilha isolada", diz o belíssimo poema de John Donne.
Ninguém
basta-se a si mesmo.
Poderíamos
pensar dessa forma: é possível que haja uma teia singular que une todos os
homens, ainda que indivíduos completamente diferentes? Há uma sincronia que nos
entrelaça na mesma ideologia e na mesma jornada? A morte de um único homem
diminuiria o tamanho do continente e seu isolamento tornaria menor a
humanidade? Talvez sim, talvez não.
Ao homem também
precisa existir o direito de se isolar, se assim for a sua vontade, com o
objetivo de refletir, de se corrigir e de se ampliar
interiormente. Aquele que encontrar a si mesmo estará apaziguado. Esse ato
também é uma contribuição ao mundo.
Os
grandes mestres, em determinada etapa da vida, isolaram-se: Buda sob a
figueira, Jesus nos desertos. Isolaram-se para que o encontro fosse possível;
para que, através da individualidade compreendida, a pluralidade
fosse alcançada. A partir dessa compreensão tornaram-se prontos para
acrescentar algo ao povo de onde vieram.
O
Ocidente vê a doação ao próximo como a mais bela forma de subjugar o ego
através do amor altruísta. Já no Oriente, na Índia principalmente,
compreende-se que 'santo' é aquele que consegue refrear os próprios desejos.
Isolado, imerso nas matas mais insalubres, praticando a abstinência, evitando
todas as sedes e as fomes que o desviem da rota da purificação, o
indivíduo sai vitorioso na guerra contra a própria ignorância. Um homem assim é
considerado quase 'deus', porque ao se iluminar, acrescenta um ponto de luz no
Universo.
Portanto
em cada povo há um conceito de iluminação. Alguns compreendem que o homem não é
e não deve ser uma ilha, que precisa de se unir ao continente; outros
crêem que sim, que é necessário que se isole, que proceda assim para
se compreender melhor.
Em
verdade, não será o homem uma ilha? Todos homens, ilhas esparsas no
oceano? Algumas, estreitas; outras, muito largas, tão vastas que
podemos chamar de continentes? Mas não importa o tamanho das ilhas. O
importante é que todas ilhas possuam pontes, que se comuniquem entre si,
que se permitam a permuta de riquezas e o aprendizado mútuo.
Concluo
que nenhum de nós possui visão de águia. Cada um pensa e vê uma parte do mundo.
Somando nossos olhos é possível enxergar um imenso panorama. A amizade, a
solidariedade e o altruísmo são pontes que nos aproximam. Mas é necessário
que a individualidade seja reverenciada, que o ensimesmamento seja livre, que
seja respeitada a vontade de ir, de vir, de se retirar no momento
desejado. Só assim, creio eu, cada homem em sua ilha
interior será uno e ao mesmo tempo universal.
Fotografia: Solitude, de Roberto Cambusano