Pandit Ravi Shankar, que no mês passado completou 90 anos, fez de tudo em música e continua fazendo: impressionante virtuose da cítara, compositor inspirado, porta-voz da música indiana, e muito mais.
Semelhante ao versátil poeta Rabindranath Tagore, Shankar também é indiano até as raízes da alma, o que não o impediu de criar uma arte acessível e compreendida pelo restante do mundo. Talvez não seja o mais autêntico, mas com certeza é um dos mais importantes compositores da Índia, pois ele mais do que ninguém estendeu pontes sobre o oceano que divide Oriente e Ocidente. Tem sido um missionário entre a cultura dos dois mundos.
Não houve outro que influenciou tanto e tão várias gerações como Ravi Shankar, desde o seu envolvimento com o guitarrista George Harrison, que o elegeu como guru musical. Entretanto, muito antes dos anos 60 e 70, antes da idealização de beatniks e hippies este admirável e incansável músico busca a dispersão dos horizontes, e cria suas obras com base nos elementos folclóricos, populares, eruditos e religiosos de seu vasto e antiquíssimo país, às vezes mesclando-os com o som de outros povos. Compõe as tradicionais ragas, talas e mantras para serem executadas na cítara, tablas, sarangi, bansuri e outros instrumentos típicos, e também utiliza a orquestra completa da música ocidental com as cordas, sopros e percussão.
Alguma autenticidade de seu próprio país acaba perdida nessa divulgação incessante, mas por outro lado desperta e conquista novos ouvintes. É preciso constatar ainda que Shankar já tocou e gravou com músicos e grupos dos mais variados genêros musicais: pop, rock, jazz e instrumentistas da música clássica antiga e moderna. E quando o compositor resolve facilitar, não se inibe até mesmo em misturar ragas e talas com canção pop para as pessoas cantarolarem nas ruas. Não obstante, a parte da obra realmente erudita do compositor é àspera e de difícil acesso.
Com o mesmo entusiasmo que o movimento hippie da década de 60 recebeu a música oriental de Shankar, hoje os idealistas da Nova Era reconhecem no grande citarista o precursor da fusão oriente-ocidente, que poderá ser a essência das artes e da música do século XXI: o cerebralismo a serviço da espiritualidade, o encontro ecumênico de todas crenças, a Unidade de todas as artes, porém sem a extinção da individualidade que faz com que cada pessoa e cada pensamento sejam únicos e ao mesmo tempo ligados pelos fios da teia Universal.
Ravi Shankar tem adquirido enorme respeito e prestígio ao longo de sua vida. Em 1988, a convite dos dirigentes da Rússia, foi o ilustre convidado em um concerto que encerrava o Festival Indiano, contando com mais de 140 músicos, ocasião em que foram executadas 7 peças, todas de autoria de Shankar, algumas com direito ao improviso como Bahu-Rang.
Esse evento pode ser confirmado neste álbum ao vivo, Inside the Kremlin, uma emocionante fusão da música indiana e do folclore russo, executados pelo grupo de Ravi Shankar e um conjunto da Rússia, acompanhados pela orquestra de Moscou e pelo coro do Ministério da Cultura da USSR. Uma apresentação única, mas graças ao registro em disco continua a nos presentear com sensações mágicas repetidas vezes.
Observem na peça Three Ragas in D minor a homenagem de Ravi Shankar a Rimsky-Korsakov, inserindo entre as ragas motivos russos e recriando na orquestração a mesma atmosfera de um dos movimentos de Sheherazade. E por que especificamente esse compositor russo? Porque ele também fundiu ocidente e oriente em algumas de suas principais obras.
Já a peça Bahu-Rang é legítima música clássica indiana, mas há momentos em que os mantras místicos da Índia soam simultaneamente com as danças campesinas eslavas, tocadas por cítaras e balalaikas. Enfim, uma oportunidade de ouvirmos dois países que sempre ofereceram um riquíssimo folclore ao mundo. Maravilhoso!
Shankar.InsideTheKremlin.Part1.zip
Shankar.InsideTheKremlin.Part2.zip
2 comentários:
Parabens pelos artigos e pelo seu Blog.
OBRIGADO PELA DIFUSÃO DESSE!!!
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